Os mistérios da crônica



por Deisiane Barbosa

Observando a etimologia da palavra crônica nos deparamos com variações do grego as quais nos remetem às noções de tempo e/ou aquilo relacionado a ele. Pouco depois o termo chronica, do latim, definiu um gênero que registrava os acontecimentos históricos, verídicos, numa sequência cronológica, sem um aprofundamento de interpretação dos fatos. Parte dessa concepção serviu para modelar o que hoje compreendermos pela crônica inserida no meio literário.
Desde a antiguidade esse gênero textual serviu para registrar acontecimentos com pessoas importantes, porém tal formato foi se alterando. Tempos depois, a partir do século XIX, a crônica se consolidou com a difusão da imprensa, mas passou também a inserir outros assuntos nas suas abordagens: começou a registrar a vida social, política, costumes e o cotidiano do seu tempo, passando também a ser publicada em revistas, jornais e folhetins. Sua escrita variava de um aspecto mais jornalístico a outro mais literário, assim vários escritores assumiram-na como um gênero literário, relatando fatos sob um ponto de vista pessoal, no objetivo de atingir a sensibilidade do público leitor.
Atualmente as crônicas se interessam pelas transformações sociais e pela valorização da história social, descentraliza de figuras ilustres e parte para a observação do corriqueiro. Afinal, o que pode ser tema numa crônica? Absolutamente tudo, pois sua matéria-prima básica são fatos ocorridos no dia-a-dia: o preço do tomate, as elevações de temperatura, as ondas de violência, os festejos tradicionais, nossa memória, a memória dos lugares onde vivemos, os hábitos da juventude; absolutamente tudo, desde coisas que apenas presenciamos a coisas que acontecem conosco, em nosso trabalho, dentro de casa, ou que vimos passar no telejornal. A matéria para a crônica está em todo lugar, basta que articulemos nossa escrita a fim de registrá-la de maneira criativa. E como fazer isso? É muito difícil? Qual a estrutura de uma crônica?
A crônica tem suas peculiaridades formais, algumas delas refere-se à mescla de essências da linguagem escrita e da oralidade; é breve, leve, de fácil acesso e envolvente; concentra uma leitura agradável, uma vez que o leitor quase sempre interage com os acontecimentos narrados; deve ser um texto curto e de linguagem simples, próxima a vários tipos de leitores, de várias faixas etárias. 
Acredita-se que ela ainda possa variar entre tipos diversos, ocorrendo também a mistura de vários tipos num só texto. Cada um desses tipos tem suas particularidades, numa crônica lírica, por exemplo, o autor relata com mais nostalgia e sentimentalismo; numa humorística faz graça com o cotidiano; numa crônica-ensaio o cronista, ironicamente, tece uma crítica ao que acontece nas relações sociais e de poder; na filosófica ele faz uma reflexão de um fato ou evento; na jornalística o autor apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos e a crônica ainda pode variar entre policial, esportiva, política, etc.
Sua aparência é simples, seu assunto pode ser banal, mas sua essência é extremamente rica, a maneira como se constrói a estrutura requer sensibilidade e concisão. Mas afinal, como se constrói uma crônica, como se começa, como se procede?
nº1: escolha um acontecimento que lhe chame a atenção. Você deve conhecer bem o assunto e ele deve lhe causar sensações (horror, medo, entusiasmo, tristeza...), pois a partir delas será mais fácil expressar-se por escrito.
nº2: Formule opiniões sobre tal fato. Liste as ideias antes de começar a crônica propriamente dita. Explicite o seu ponto de vista, sua uma visão pessoal de um evento.
nº3: Defina o tipo de crônica que se pretende escrever (narrativo, jornalístico, descritivo, entre outras) e pense quais ferramentas utilizar para configurar o seu texto de acordo com essa tipologia.
nº4: Inicie a crônica abordando o tema a ser desenvolvido. Faz-se importante clareza para que fique subentendido ao leitor sobre o que será comentado no decorrer do texto, tendo a cautela para que sua introdução não se torne um pequeno resumo da sua crônica.
nº5: Seja conciso. Uma boa introdução não deve ser necessariamente longa. Ao contrário, a mesma pode ser muitas vezes feita com apenas um parágrafo. O ideal é escrever períodos curtos, a fim de não tornar cansativa a leitura, tornando-a desagradável e cansativa.
nº6: A parte introdutória nunca deve fazer desvios do assunto principal. Evite fazer rodeios com as palavras. Foco é essencial para que todo o restante do texto seja coerente. Uma crônica é curta e ela precisa ser objetiva na medida certa.
Por fim, recomenda-se escrever diariamente, pois tal hábito faz-se a maneira ideal de se tornar um bom escritor não só de crônicas, mas também de outros gêneros textuais. Beneficiará, sobretudo, sua comunicação e expressão por via escrita.
Outras dicas importantes são: uma crônica não deve ter muitos personagens (a depender do estilo, às vezes nem personagens tem); é bom que se evite fantasiar demais, lembre-se da objetividade necessária; expresse sua opinião; uma crônica é rápida e curta. Depois que terminou, revise! Deixe o texto descansar, depois volte, releia, procure identificar os erros que tenha passado despercebidos no ato de escrita.

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Deisiane Barbosa é arte educadora na Casa de Barro, onde trabalha a Escrita Criativa ligada à Educação Patrimonial. Graduando em Artes Visuais pela UFRB, realiza produções artísticas em performance, videoarte e fotografia, sempre associadas a criações da Literatura. Atualmente pesquisa a carta como um gênero literário expresso em meios visuais como a arte postal.

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